Advogados do Paraná manifestam repúdio à declaração de Bolsonaro
O presidente Jair Bolsonaro afirmou nesta segunda-feira (29) que “um dia” contará ao presidente da Ordem do Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, como o pai do jurista desapareceu na ditadura militar, caso seja de seu interesse.
Ainda, disse que Santa Cruz “não vai querer saber a verdade” sobre o pai, Fernando Augusto de Santa Cruz Oliveira, cujos restos mortais até hoje não foram entregues á família.
De acordo com a Comissão da Verdade, Fernando Santa Cruz “morto por agentes do Estado brasileiro”, depois de ter sido preso em Copacabana no Rio de Janeiro, em 1974, por um grupo do DOI-CODI (Destacamento de Operações de Informação – Centro de Operações de Defesa Interna), órgão subordinado ao Exército.
O presidente deu a declaração ao comentar o desfecho do processo judicial que considerou Adélio Bispo, autor da facada em Bolsonaro durante a campanha eleitoral, inimputável.
Diante do silêncio obsequioso da OAB/PR para com Bolsonaro, o movimento Algo Novo (chapa de oposição nas eleições passadas) soltou Nota em solidariedade ao presidente da OAB Nacional, Felipe Santa Cruz.
Confira a íntegra da nota:
NOTA DE REPÚDIO À DECLARAÇÃO DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA
O Movimento Algo Novo na Advocacia do Paraná vem manifestar seu veemente repúdio à seguinte declaração dada ontem pelo Presidente da República, Jair Bolsonaro: “Um dia, se o Presidente da OAB quiser saber como é que o pai dele desapareceu no período militar, conto pra ele. Ele não vai querer ouvir a verdade. Eu conto pra ele”.
Fernando Augusto de Santa Cruz Oliveira, pai do Presidente do Conselho Federal da OAB, Felipe Santa Cruz, desapareceu no Rio de Janeiro em 1974. Fernando era integrante da Ação Popular, organização de oposição à ditadura militar. No livro “Direito à Memória e à Verdade,” o governo brasileiro reconheceu que Fernando foi preso no dia 23 de fevereiro de 1974 por agentes do DOI-CODI do Rio de Janeiro. Seu atestado de óbito foi retificado, por ordem da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, para fazer constar que ele faleceu “em razão de morte não natural, violenta, causada pelo Estado brasileiro, no contexto da perseguição sistemática e generalizada à população identificada como opositora política ao regime ditatorial de 1964 a 1985”.
Para além do gesto desprezível, desumano e covarde, que ofendeu a família de Felipe Santa Cruz e de todos os que tiveram familiares e amigos desaparecidos ou assassinados durante a ditadura militar, a manifestação de Jair Bolsonaro teve o claro intuito de atingir a OAB enquanto instituição encarregada da defesa do Estado Democrático de Direito (art. 44, I do Estatuto da OAB). A declaração veio logo após crítica do presidente à atuação da OAB, que no caso Adélio Bispo teria intervindo para impedir que a Polícia Federal tivesse acesso ao telefone de um dos advogados da defesa. Disse o Presidente da República: “Por que a OAB impediu que a Polícia Federal entrasse no telefone de um dos caríssimos advogados. Qual a intenção da OAB? Quem é essa OAB?”.
Esse comportamento inaceitável caracteriza quebra de decoro e, portanto, crime de responsabilidade, punível com a perda do mandato.
O Movimento Algo Novo
na Advocacia do Paraná, ao mesmo tempo em que repudia a conduta absolutamente
incompatível com o cargo de Presidente da República, confia e espera que os
poderes constituídos – especialmente o Ministério Público Federal, o Congresso
Nacional e, quando provocado, o Supremo Tribunal
Federal – tomem as medidas adequadas, previstas na Constituição da República,
para que o ofensor seja punido pelos crimes comum e de responsabilidade.
Ao Presidente Felipe Santa Cruz, o nosso total e incondicionado apoio. A Advocacia Brasileira já demonstrou que não se acovarda diante de governos autoritários.
Curitiba, 30 de julho de 2019.
COORDENAÇÃO DO MOVIMENTO ALGO NOVO NA ADVOCACIA DO PARANÁ
Manoel Caetano Ferreira Filho / Marcelo Trindade de Almeida /Lijeane Santos