Família se forma em direito para apoiar deficiente visual e dão exemplo de superação

Ela enxerga muito pouco, cerca de 5%. Ela nasceu assim, mas a limitação visual nunca a impediu de fazer o que gosta e acredita. Desde criança Jaqueline Lopes de Sampaio, andou de bicicleta, fez ballet, é desenhista e agora, concluiu a faculdade de Direito.

A família muito mais que dar apoio embarcou nesta jornada com a Jaque, como é carinhosamente chamada pelos familiares e amigos. A mãe Ana Maria Lopes de Sampaio de 48 anos e o irmão Willian Lopes Sampaio de 26 anos também fizeram o curso. E os três juntos colaram grau no início deste mês.

Segundo Ana que é professora da rede municipal de Arapongas, no início seu intuito simplesmente era de ajudar a filha. “Sempre tive interesse pelo curso, mas no começo minha intenção era de apoiá-la, auxiliando no que ela precisa-se para realizar o sonho dela, mas também me apaixonei pela área”, lembra.

Já com William a história foi um pouco diferente. Ele conta que pensava em fazer uma faculdade de design ou publicidade, mas resolveu na hora da inscrição mudar de curso e apoiar a irmã. “Para as pessoas em geral fazer uma faculdade já é difícil, eu sei das dificuldades e limitações de minha irmã, tinha que apoiar e ajudar de alguma maneira, por isso mudei”, conta.

Segundo a família os professores e coordenadora da instituição foram fundamentais para a realização do curso. A família conta que tinha muito receio que Jaque sofresse algum tipo de preconceito. “A Jaque sofreu muito bullyng nos colégios onde passou, exceto no Colégio Marquês de Caravelas. A escola que acolheu melhor minha filha foi lá. Ela se adaptou, fez amigos. Tive medo de quando fosse pra faculdade passasse por alguma discriminação”, lembra a mãe.

Ao longo dos cinco anos de curso Jaqueline e sua família foram vencendo as dificuldades. “Eu tinha que gravar as aulas para poder estudar e a sala tinha bastante alunos o que acabava gerando barulho durante as aulas. Ao longo do tempo a turma foi entendendo que eu precisava de silêncio para ter material de estudo, eu me adaptei a sala e eles se adaptaram a mim”, conta Jaqueline.

 “Quando finalizamos o primeiro semestre nos sentimos vitoriosos. Fazia muito tempo que eu não estudava. Conciliar trabalho, família e estudo foi desafiador. No início me sentia travada, mas pra minha mente foi libertador, pois independentemente da idade todos temos potencial”, conta Ana.

Eles lembram que quando chegaram no terceiro semestre sentiram que conseguiriam finalizar o curso. “Depois do meio da faculdade o tempo voou, passou rápido. Ver que uma turma que começou com cerca de 95 alunos, e pelo caminho iam tendo algumas desistências e nós ali lutando, eu nem acreditava”, lembra emocionada Jaqueline.

“Na hora que pegamos o diploma eu me segurei pra não chorar, mas quando chegamos em casa eu me minha mãe choramos muito”, lembra Jaqueline. Segundo ela ter o apoio da família foi uma responsabilidade. “Sonhar o sonho da sua irmã, da sua filha, e eu no meio de tudo isso é muita responsabilidade. Temos que confiar no que estamos fazendo, orar, se dedicar. Não tenho palavras, é muito especial e bonito, não consigo nem descrever, foi uma prova de amor deles por mim”, diz emocionada Jaqueline.

Orgulhoso, o pai Joacir de Sampaio de 55 anos que trabalha como frentista em um posto da cidade, deu o suporte necessário para a família, cuidando da casa e incentivando os três. Ele trabalha no período da noite para poder ficar com a filha durante o dia. O pai se emociona com a história da família. “Estar na colação de grau dos três e ver a minha filha sendo oradora da turma e relembrar todas as dificuldades que superamos foi emocionante. Tenho muito orgulho da minha família,” conta.

A rotina em casa é gerida em torno da Jaqueline. “Em boa parte do tempo programamos  nossas atividades e serviços para sempre ter alguém em casa, não deixamos ela sozinha, mas quando precisamos ela se vira muito bem”, conta a mãe.

“Não tenho medo de ficar só, até porque acredito num Deus muito grande. E sempre que estou sozinha, ou desenhando sinto uma presença a meu lado, uma energia muito positiva, como um anjo da guarda”, relata Jaqueline.

Futuro

Agora a próxima etapa é fazer cursinho e se preparar para a para fazer a prova da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). “Já temos um cursinho em vista, quero tirar a OAB e se Deus me permitir, trabalhar na área”, conta Ana. Wiliam está na procura de um emprego pra ajudar nas despesas da casa e pagar o cursinho. “Fiquei desempregado ao longo do curso e foquei em ajudar em casa com minha irmã, estudando e repassando as aulas, agora tenho que retomar o trabalho”, diz Willian. Já Jacqueline conta que gosta de todas as áreas e está avaliando todas as possibilidades.

“A deficiência não pode ser desculpa para se acomodar. Tento retribuir o esforço deles me dedicando, estudando e correndo atrás. Acredito que enquanto temos saúde não podemos parar”, explica Jaqueline.

Sonho

Além de ter conquistado o diploma de Direito, Jaqueline é uma excelente desenhista. O novo sonho da jovem agora é poder realizar uma exposição exclusiva de suas obras na biblioteca municipal de Arapongas. “Quero mostrar meu trabalho, pois meus desenhos são uma forma que encontrei de me expressar” diz.

Segundo Jaque, os desenhos trazem informações de seu cotidiano, fatos históricos, sonhos e imaginação. “Busco inspiração em coisas que vejo e escuto no dia a dia”, relata.

Na redes sociais, Jaqueline também busca trocar informações e incentivar outros deficientes a lutar pelos seus direitos e se inserirem na sociedade. “Toda pessoa que conheço tento plantar uma sementinha, pois ela tem que expandir seu olhar sobre a vida e lutar pelo que acredita”, finaliza.

 

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